CICLOS – CAMINHO E UNIDADE - Por Artur Alonso
"O ser humano tem muitas peles em si mesmo, que lhe cobrem as profundezas do coração" (Meister Eckhart)
Um olhar atento e mais profundo do desenvolvimento cíclico das sociedades e dos centros civilizacionais nos amostra que três suportes fundamentais são encaixados, nas narrativas que dão base aquela cosmogonia e cosmovisão que cria a unidade:
a) uma tradição ligada ao imaginário mitológico
b) os fundamentos ideológico – filosóficos que constituem, junto aos fundamentos religiosos, a alma da comunidade. Sendo um estado o unidade com diversidade de culturas e cultos, mantendo essas culturas e cultos unidos pela essência comum – duma filosofia de estado – e um consenso constitucional – do que deriva a lei estatal
c) a cronologia histórica – um estado pluri-nacional, multi-confessional e multi-étnico a cronologia histórica redatada na base da unidade.
A herança da unidade familiar, de clã, e mesmo a individual também pode conter estes três suportes fundamentais. Tríade constituinte que está ligada a sua vez ao desenvolvimento do ciclo da tríade vital: nascimento – crescimento – dissolução ou morte, que marca o caminho de toda efémera existência, aqui no plano físico da matéria
No plano individual estas duas tríades estão a sua vez intercetadas com a tríade da profunda experiência vital humana, que bem interpretada pelas pessoas, desenvolve a observação de entender que durante nosso percurso de infância-adolescência, maturidade e velhice, atravessaremos por três etapas também:
a) A primeira formativa – educacional – de aquisição do conhecimento
b) A segunda de realização, segundo nossa formação e aprendizado, da verdadeira conquista: a conquista interior de elevação espiritual e a conquista nobre exterior: trabalho, família, relações sociais de companheirismo e amizade
c) A terceira etapa de retribuição – dar com amor rigoroso, todo aquilo que com amor e rigor nos foi entregado
Se observamos, mais detidamente, iremos descobrir um dos maiores mistérios das tríades ou Trisquel simbólico do caminho individual: aquele de entender as tríades trabalhar de modo circular, tendo em cada etapa, a sua vez, todas as outras etapas permanecia.
Assim na primeira etapa do conhecer, a vez que nos formamos recebemos, mas também nos realizamos como alunos, filhos, amigos… e a vez damos (segundo a grandeza do nosso coração) aos outros que nos acompanham em nosso evoluir cíclico
Na segundo etapa ao tempo que nos realizamos - conquistamos nossos sonhos ou tentamos concretizar, segundo nossas capacidades, atitudes, ambiência e oportunidades, o melhor da nossa potencialidade; também vamos obtendo outro aprendizado com as lições da vida. Recebemos e vamos dando igualmente segundo a grandeza do coração de cada pessoa, que não por acaso aparece em nossa viagem
E na terceira etapa ao tempo que nos damos aos netos, filhos, amigos… podemos chegar a obter – receber, se estiver ao nosso alcance a paz do coração, e com ela a maior das realizações possíveis.
Por seu tempo todo este conjunto de tríades simbólicos, Trisquel, estão ligados aquela ideia, também tripla, do inicio, meio e fim.
Nas letra hebraicas o podemos contemplar pelo Alpeh, Men, Tav
Sendo a guematria do Aleph o número 1 – da Unidade de onde tudo emerge – emana
Sendo a guematria de Men – o número 40
e o Tav cuja guematria é 400, que o homologa com Men (40) e a porta Daleth (4), pois Tav e a porta de regresso. Mas também o caminho do meio que conduz a verdade, pois descorre entre as polaridades, harmonizando-as.
Tav relacionado com a palavra Emet (que contem um Tav ao final) Emet que significa verdade. Para a verdade concretizar-se ao final do nosso caminho, ou bem melhor dito, para no final do nosso caminho poder obter a verdade é preciso desde o inicio tomar contanto com esta verdade, por meio do conhecimento. E chegada a maturidade na realização e conquista dos nossos sonhos, ter mantido a verdade que nos permita relativizar nosso trunfos. Com humildade, sem cair na arrogância e mantendo a bondade, ate chegar ao fim, para poder ter lampejos maiores dessa “verdade” e ter a oportunidade de concretizar a mesma. Obtendo a paz interior do coração, reservada àqueles que estão no seu momento de receber a mesma.
Mas a letra Tav também se relaciona, em seu final, com a palavra Met, com significado de morte. Eis aqui que se pode observar o morto conter na sua viagem de regresso à fonte, a mesma verdade, pela qual veio a vida.
A Torah também tem o Tav no seu inicio, simbolizando que a palavra de Deus começa sempre com a verdade. Aqueles que distorcer aquela palavra ou modificar o significado da mesma, encontram na inversão da verdade a mentira.
Sendo a verdade associada a bondade, o bem, a justiça, a paz e a beleza. A mentira nasce com a maldade, que semeia o mal, a injustiça, desestabiliza a paz criando a confusão da guerra e destruíndo a beleza. Ao destruir a beleza, a bondade, e o bem, o Amor do mundo desaparece.
Sabeis por quê esta verdade, ninguém vai explicar-vos? Por que aqueles que a conquistam, ascendendo à paz interior, se a revelassem a perderiam… Somente podem com seu exemplo de vida mostrar-vos o caminho. Esse “dedo indicado o caminho” que marca a vida do herói / heroína – conquistador/a da verdade, serve para que vós, tenhais em alguma vida, chegado o vosso adequado momento evolutivo, oportunidade de concretizar a mesma, por meio de criar o vosso próprio caminho heroico: a vossa própria jornada épica…
Esta premissa, da que acabamos de falar, forma a base dos mistérios dos “Avataras” de ciclo, o filhos de Deus (dos quais nos falam as diversas mitologias) – Avataras entendidos, segundo as diversas narrativas mitológicas, como as encarnações da própria divindade na terra
Dai, agora, podemos inferir que todas aquelas tríades ou Trisquel cíclicos emanar, confluir e estar relacionadas com aquela Superior Tríade ou Trisquel Maior mitológico do Pai e Mãe Cósmica, parelha primordial de toda mitologia (em muitas relacionadas com o ovo, óvulo, ou gameta primordial – o ovo órfico, o ovo védico de Hiranyagarbha, aquela pérola branca da cultura yazidí) A parelha primordial que ao unir-se dá a luz ao Filho / Filha – seus representantes no mundo material.
Sendo aquele filho – filha, ou “Avatara” que no caso da mundo celta galaíco são representados, como gémeos espirituais, pela dupla parelha de irmãos Lugh e Brigantia
Seguir seu caminho, reviver nas cerimonias litúrgicas suas vidas, forma parte do modelo exterior religioso que sinaliza o caminho guia. Nele o filho da divindade marca, com sua heroica vida, o caminho ético – evolutivo que deve servir de guia à humanidade.
Ismael Regardi, no seu estudo “A Árvore da Vida” reflexionava sobre esta questão: "Na missa católica a vida e o ministério divinos do Filho do Deus cristão são celebrados, em seguida a crucificação de seu salvador, e sua ressurreição final em glória seguida da assunção aos céus. Em épocas mais antigas, esta celebração da missa era acompanhada por procissões deslumbrantes e cortejos dos mistérios cheios de suntuosidade, esplendor e pompa, embora se deva confessar que na ausência da técnica mágica toda essa ostentação externa contava muito pouco. O Terceiro Grau dos maçons dramatiza o assassinato do Mestre, Hiram Abiff, e sua ressurreição se segue posteriormente por um ato mágico, o soar da palavra mágica perdida devolvendo H. A. à vida"
O próprio Regardi (aludindo a outras fontes), nos fala no mesmo trabalho da cerimonia ritual do Deus Osíris em Ábidos, denominado-a de “ritual Dramático”: “O primeiro era uma procissão na qual o antigo deus da morte, Upwawet, tornava reto o caminho para Osíris. No segundo a própria grande divindade aparecia na barca sagrada, que era também colocada à disposição de um número limitado dos mais ilustres dos visitantes peregrinos. A viagem da embarcação era retardada por atores vestidos como os inimigos de Osíris, Set e sua companhia... Seguia-se um combate no qual ferimentos reais parecem ter sido dados e recebidos... Este evento parece ter ocorrido durante o terceiro ato, que era uma alegoria dos triunfos de Osíris. O quarto ato retratava a saída de Thoth, provavelmente em busca do corpo da vítima divina. Seguiam-se as cerimonias de preparo para o funeral de Osíris e a marcha do populacho ao santuário do deserto além de Ábidos para inumar o deus em seu túmulo. Em seguida era representada uma grande batalha entre o vingador Hórus e Set, e no ato final Osíris reaparecia, sua vida recuperada, e adentrava o templo de Ábidos numa procissão triunfal”
Este simbólico "via crucis" é, nem mais nem menos que o caminho do herói, que de ser percorrido pelos seres humanos, nos dá a oportunidade da libertação, através do conhecimento daquela verdade, que não pode ser revelada. Pois esta nasce no coração do herói, conforme este vai superando suas etapas e provações transcendentes.
Joseph Cambpell, na sua “Jornada do Herói” nos revela este caminho em doze etapas: o mundo comum; o chamado à aventura; a recusa do chamado; o encontro com o mentor; a travessia do primeiro limiar; as provas, os aliados e inimigos; a aproximação da caverna secreta; a provação; a recompensa; o caminho de volta; a ressurreição; e o retorno com o elixir.
Incitando-nos o próprio autor a seguir estes 12 passos cíclicos, quando afirmava: “naquela caverna na que tu temes entrar, se encontra aquele tesouro que procuras”... Fazendo referência ao simbolismo da vela: com sua luz e sombra: as treves que escondem a luz.
Estas 12 etapas interligadas com o número 12 místico. Aquele das 12 horas do Nucteremon de Apólinio de Tiana, das 12 casas zodicais, dos 12 apostolos, os 12 cavaleiros da “Tabula Redonda” do rei Artur (Kay, Lancelot, Gaheris, Bedivere, Lamorak de Galis, Gawain, Galahad, Tristão, Gareth, Percival, Boors e Geraint ); as 12 tribus; os 12 patriarcas (Adão, Set, Enosh, Cainã, Malaleel , Jared, Henoc , Matusalém , Lamec e Noé)…
Este caminho do herói é feito com a aceitação da morte para o plano material e o ascender, por meio da ressurreição até um plano maior espiritual
Os filhos ou filhas da divindade – vidas heroicas a imitar pelos humanos, que já obtiveram as capacidades e tiveram a oportunidade para tal, – são referenciados, normalmente, assumido em si mesmos (ou bem polarizando-se em dous) o lado do rigor e o lado do amor. No lado do rigor amoroso temos o filho protetor da humanidade contra as hordas predadoras – assassinas. No lado do amor “o cordeiro de Deus” que com sua entrega tira os pecados ao mundo.
Filhos de Deus como o Cristo, desenvolvem o rigor da proteção contra os predadores, quando com força obrigam a retirar-se aos mercadores do Templo, para evitar esse tempo de extremo sofrimento, que deriva da substituição do Deus – Transcendente, pelo Deus – da materialidade.
Quando acontece a inversão do caminho da transformação interior (substituição da nossas sombras por luz, das nossas tendências perniciosas, por tendenciais saudáveis amorosas). Substituição nos tempos obscuros, quando ocorre a mudança do caminho da luz pelo caminho da atração material, das sombras. Inversão do caminho da procura da ética, que procura a verdade e o controlo das emoções; pelo caminho da corrupção, a demagogia, e a mentira que procura o desfrute das baixas paixões…
A batalha interior para vencer as inercias que nos levam ao caminho da perdição, permitindo-nos trilhar “a gloriosa senda” que conduz a redenção, precisa de uma continua observância dos sentidos.
Focando nossa atenção no presente, que permite fugir das daninhas memórias do passado, que projetam sua estelar linha do tempo sobre o futuro, impedindo-nos de “ancorar” nossa vontade na intenção de trabalhar nossa mudança.
Daí o trabalho de concentração – meditação ser tão preciso e precioso.
Para ultrapassar aquelas distrações da atração instintiva, encaminhadas à realização do gozo efémero na matéria,. Para conseguir mudar essa dinámica será preciso encontrar a concentração do bom caminhante. Aquele “Dhâranâ” que permite confrontar os medos que geram preocupações.
Precisamente esse é o “caminho do herói/heroína” é o caminho daqueles que confrontam o medo maior, o medo que paralisa: O Medo atávico à morte.
Falam os grandes Mestres que “Dhâranâ” - “a concentração perfeita que só é alcançada, verdadeiramente, quando conseguimos, através de exercícios persistentes, dominar por completo a nossa natureza física, mental e emocional” Vemos aqui outra tríade – condicionada – a ser pela nossa Tríade Superior trabalhada.
Aquele Tríade Superior -simboliza o nosso “Anjo guardião” mitológico, o nosso Ser Divino, a mónade imortal – o ser imperturbado, eterno. Aquele que segundo os teosofos, em cada nova encarnação se cobre de novas vestes.
Sendo assim aquela tríade que os teosofos relacionam ao Corpo Átmico, Corpo Búdico e Corpo Intuicional (em conexão com a Tríade Cósmica do Pai, Mãe e Filho/Filha) trabalha sobre o quaternário inferior – o corpo racional, corpo emocional – astral, corpo etérico e corpo físico, para com sua vontade bem dirigida pela saudável e amorosa intenção transformar as tendências egolátras destrutivas, disruptivas e tendências altruístas construtivas. Permitindo nossa pisque individual e coletiva modificar, para poder fomentar a confiança que permite realizar a ajuda mútua.
O herói/heroína, no percurso de transformação, vai pouco a pouco, vida a vida, avançando ate chegar, definitivamente, àquela cova onde se encontra (inconsciente e subconsciente) agachado o Grande Medo à morte. Entrar no mais profundo dela, para finalmente o mesmo medo vencer e obter o tesouro da verdade: revelada, por esta conquista, somente a ele.
Por meio da boa concentração em “Dhâranâ” – tal como Buda fez, debaixo da figueira, em uma luta contra a morte, em luta contra o Demónio da Ilusão “Mara - ate vencer” – E assim poder, finalmente, ultrapassar o engano daquele medo – que nos controla – ao fazer-nos identificar nosso ser a um corpo. Vivendo no ter, possuir, que nos distrai do ser a realizar.
“Dhâranâ”, no fim do nosso ciclo (chegado nosso momento adequado, na vida adequada, após muitas conquista vida a vida) permite abrir para nós os portões da ilusão, para imergir no Todo-Uno e em ele dilatar-nos.
Vida a vida confrontando nosso turbilhões mentais, poderemos ir conseguindo, nossa concentração ser, a cada dia melhor, a cada vida mais efetiva.
Abandonando o caminho da atração supérflua e adentrando-nos na senda da correta vida. Nossa Tríade Superior em comunhão com a Tríade Cósmica, conseguirá dominar as inércias do nosso inferior corpo – o Quaternário que se deixa atrair pela ilusão da matéria.
Essa nossa Tríade Superior também pode ser ativada atraves dos três caminhos da Vedanta: Jnâna – Karma – Bhakt – Esses três caminhos podem também ser encontrados nos três pilares da árvore da Vida: Rigor – Harmonia e Amor; também conhecidos como Força, Equilíbrio e Misericórdia.
Muitas são as escolas, mas somente o Mestre Interior aparecerá, quando o aluno ou aluna estiverem preparados.
"Que o Amor que está presente em nós, ilumine as portas do mundo"
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